quarta-feira, 29 de novembro de 2017

ENTRE RELEVOS uma mediação entre saberes Lucas Dupin

ENTRE RELEVOS
uma mediação entre saberes
Lucas Dupin

Ações na arte atual nos surpreendem cada vez mais nos colocando às margens da “experiência limite”. O poeta Rilke dizia que os versos não são sentimentos, são experiências. Por sua vez, Blanchot assegurava que para escrever um único verso é preciso ter visto muitas cidades, muitos homens e coisas. Trazemos o termo “experiência” no sentido do contato com o ser, renovação do eu nesse contato e o termo “limite” como risco nas vias da criação artística. É assim que Lucas Dupin desenvolve em Entre Relevos uma “experiência limite”, por meio da mediação entre saberes populares, colocando em relevo culturas de localidades distantes.

Dupin aproxima a experiência das culturas de duas regiões diferentes: a da xilogravura na cidade de Bezerros, em Pernambuco, e a dos doces bordados de mamão de Carmo do Rio Claro, em Minas Gerais. No caso de Bezerros, é a partir da apresentação do próprio doce e de seus processos, que o artista convida o ato criativo dos xilogravadores. Assim, desse contato possibilitado pelo artista, foi criado um cordel por J.Borges sobre a produção dos doces e um conjunto de imagens realizadas por cada um dos xilogravadores de sua família. Enquanto os Borges de Bezerros gravaram na madeira imagens de uma cultura até então desconhecida para eles, as doceiras de Carmo do Rio Claro gravaram na superfície do mamão desenhos de frutas locais, tomando como referência a série de xilogravuras “frutas do nordeste” de J.Borges.

O aspecto expressivo de ambos saberes está no modo de produção de uma imagem em relevo cujas formas estão diretamente ligadas às ferramentas de trabalho confeccionadas pelos próprios artistas ou artesãos. Outro ponto em comum é o modo de transmissão deste conhecimento, quase sempre na escala de ‘um para um’, mantendo certa continuidade na metodologia de produção destes saberes. Assim, duas culturas que outrora pareciam distantes são colocadas em contato por Dupin, impulsionado em grande parte pelo fato de ter crescido em meio à prática dessa técnica peculiar de preparação de doce e mais tarde à prática da xilogravura.

É notório na arte feita por autodidatas, geralmente chamada de arte popular, trabalhar a partir dos recursos que o entorno oferece: temáticas, histórias, matérias prima, instrumentos e a construção de uma mitopoética. De igual modo, evidencia-se nesta proposta a afinidade entre o Dupin e esse grupo de artistas e artesãs quando observamos seu processo criativo em outros trabalhos. Seja em obras performáticas, de intervenção ou na potencialização de objetos, estão sempre presentes a incorporação do lugar e dos recursos do próprio meio nos quais os trabalhos foram realizados.

A experiência de Lucas Dupin em Entre Relevos passa por um processo de facilitador de um diálogo, sem a materialização de objetos que caracterizem propriamente um trabalho autoral. O trabalho do artista está justamente no processo e na experiência, assim como o arranjo e seus resultados apresentados no espaço expográfico. Dessa forma ele comenta:

[...] a minha autoria enquanto artista é diluída entre o trabalho dos artistas e artesãos, mas retorna ao espaço expositivo quando busco tornar visível os diferentes diálogos estabelecidos ao longo desse processo de vivência.

Cabem aqui, com esse apontamento, algumas quebras de paradigmas tradicionais entre o autor e “sua obra”: “eu é um outro” (Rimbaud) ou o artista lançado para fora da obra em uma “experiência limite”.

A produção artística de Dupin, no sentido mais amplo, expressa uma inquietude pela diversidade de expressões, ora objeto, ora performance, ora intervenção, sendo que, em obras anteriores como Paisagens Submersas (2007), deSERto (2010), Livro Paisagem (2010), entre outras, há uma forte recorrência ao texto: suportes, conteúdo linguístico ou imagem e signos gráficos. Observamos, também, nesses trabalhos ações que remetem à técnica da gravura: esfolando superfícies, marcando adobes com signos, gravando com fogo a superfície de livros ou nas xilogravuras. Em Entre Relevos esses signos (texto, gravura) encontram uma expressividade diferenciada na produção do grupo de artistas e artesãs em mediação.

Os limites entre a arte feita por autodidatas e a arte feita por artistas contemporâneos ou eruditos, no sentido da formação acadêmica, vão se diluindo na medida em que a arte contemporânea facilita esses diálogos. Conceitos delimitados na historia da arte são lançados por terra quando nos deparamos em exposições como esta, que para a arte basta a singela expressão da alma e dos saberes em formas simbólicas.

Jorge Cabrera
Texto de apresentação de Entre Relevos
Exposição do Lucas Dupin. 
11-05-2005 

segunda-feira, 20 de novembro de 2017

A natureza desenha rabiscos e grafita com delicadeza os muros


a natureza desenha rabiscos e grafita com delicadeza os muros

o que vos aflige?


O que vos aflige?

quem vejo - quem me observa


quem vejo - quem me observa

É um conjunto de imagens da cidade de Coimbra, que vem a ser uma forma de descobrî-la por meio de seus detalhes - detalhes ocultos - que são revelados. detalhes pelos quais somos observados, mas nós não os vemos, não os sentimos: objetos, imagens, paisagens, mutantes pelo tempo do homem e da natureza, pelo tempo da chuva, pelo tempo do sol, pelo tempo do tempo - gente, objetos, paisagens, gente, tempo. revelação aos meus olhos no inicio de uma viagem nesta cidade [que quando?] deixemos-a ao aqui e agora. que seja uma viagem no presente.